Mais que uma batalha contra o sistema, uma luta interna
Camila Diforena*
Uma pessoa que decide parir no Brasil de 2021, precisa ter muita certeza do que quer e muita determinação para lutar contra uma cultura cesarista que começa, muitas vezes, dentro de casa.
A resistência do marido ou da parceira à ideia, a avó (ou ambas!) dizendo que parto normal é uma carnificina, a vizinha ou o colega de trabalho insistindo que a cesariana é muito melhor para a futura vida sexual do casal, a lista de pessoas com opiniões formadas contrárias ao parto normal, “deuzolivre” natural ou humanizado é infinita. Sem entrar no mérito do sistema em si, de convênios médicos, ginecologistas com índices de quase 100% de cesarianas (às vezes escapa um “bebê-quiabinho” que resolve não se submeter ao sistema e chegar antes da cesariana) e do patriarcado, precisamos falar da batalha interna para acreditar que sim, o parto vaginal é possível; nosso corpo é capaz.
Crescemos ouvindo histórias de parto que mais parecem saídas de filmes de horror. As gerações anteriores que tiveram um parto vaginal sofreram de tamanha violência física e emocional que, de normal esses partos não tiveram nada. Conversando com mulheres que tiveram seus filhos nas décadas de 70, 80 ou até mesmo 90, o que mais escuto são histórias de episiotomias que “desciam até a coxa”, parte do combo episiotomia-fórceps, enfermeiras subindo na barriga da mãe porque o bebê não queria sair, mães que, de tão dopadas nem sabem o que realmente aconteceu durante esses partos. “Você nasceu roxinha”, ainda bem que o médico fez cesariana senão você teria morrido ou o clássico “Eu nunca tive dilatação”. Cansadas de sofrer, os nascimentos subsequentes foram cesarianas marcadas, ou simplesmente o primeiro parto já foi cesariana, por influência das amigas e famílias.
Essas conversas habitam o imaginário popular, são recontadas e revividas de forma animada pela rede de apoio (que muitas vezes mais parece uma rede de agouro) e às vezes até por transeuntes que não perdem uma oportunidade ao ver uma barriga e relembrar da história de uma conhecida que, claro, quase morreu tentando o parto normal.
Como fica o nosso subconsciente nessa história toda? Já que fomos condicionadas a sermos boas meninas (e menines) e escutar as nossas mães? Mães que querem o melhor para os filhos, claro! E que não suportariam ver uma cria passando pelo que passaram.
Esse repertório de histórias agourentas ocupa um espaço enorme no nosso cérebro. O que fazer, então, para substituir esses pensamentos, dogmas e códigos que, de tão profundamente implantados na nossa mente parecem impossíveis de serem mudados?
Uma das ferramentas mais importantes do método GentleBirth é a auto-hipnose. A princípio a ideia de hipnose pode soar assustadora. Como assim? Fazer coisas que eu não quero? Estar desfalecida ou dormindo enquanto meu bebê nasce? Como eu, uma pessoa moderna e analítica me permitirei ser hipnotizada? Uma pessoa moderna e ocupada, eu não tenho tempo disponível para essas coisas!
Alterar essas crenças tão arraigadas, as substituindo por imagens positivas de um parto normal, tranquilo e em controle é bem possível através dos exercícios de auto-hipnose. Substituir conceitos tão fortes por outros que te dizem que sim, seu corpo está pronto para parir, seu parto natural é possível. Desativar as respostas de fuga ou luta e hackear nossos hormônios para sermos inundados por endorfinas durante todo o processo é possível e alcançável. Silenciar essas vozes que insistem em dizer tudo o que pode potencialmente dar errado e subtituí-las por outras, muito mais realistas, positivas e gentis.
Nessa jornada interna, você pode ter a mão recursos tecnológicos como o aplicativo GentleBirth Hypnobirthing que se torna um grande amigo nas noites inquietas e possivelmente insones. O treinamento mental é uma prática constante que garante, além de possíveis noites de sono mais tranquilo, mudanças profundas de mindset.
Uma possível resistência inicial, interna mesmo, é esperada da nossa mente analítica. Esse primeiro passo, quando percebido como algo natural e parte do processo, nos permite entender os nossos mecanismos de pensamento. Nos proporciona compreender qual o nosso mindset para determinados aspectos das nossas crenças. Mindset fixo ou de crescimento? Como passar por cima dessas barreiras, conscientemente, através da prática de mindfulness, ou inconscientemente, utilizando-se das ferramentas poderosas de auto-hipnose e visualizações poderosas que nos mostram um caminho tranquilo e possível.
Depois dessa primeira barreira, daí sim podemos partir para cima dos outros obstáculos, com autoconfiança e gentileza, acreditando no melhor parto possível, para a mãe e para o bebê.
*Camila Diforena é mãe de dois, doula e educadora perinatal e certificada GentleBirth. Você a encontra no Instagram @camiladoula.poa