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Tudo e um pouco mais sobre preparação mental para o parto, gestação, puerpério e parentalidade.

Quando é preciso caminhar de mãos dadas com a dor

Quando é preciso caminhar de mãos dadas com a dor

Patrícia Hernandez*

É preciso pausar e sentir para seguir. Pode parecer confuso esse pensamento de que precisamos parar durante a vida para que possamos seguir nosso caminho, mas é exatamente isso que pode fazer a diferença e nos permitir continuar. Algumas vezes estamos tão imersas no aceleramento que a vida moderna nos colocou que sequer nos damos conta do que sentimos de verdade. Esquecemos de olhar para nós mesmas, reconhecer valores e tudo que já crescemos e evoluímos.

Até que um dia aparecem duas listrinhas num teste de farmácia e nosso coração acelera descompassado. Mesmo numa gestação desejada ou esperada, também vem a secura nos lábios e um milhão de pensamentos em microssegundos projeções e fantasias que nos levam para um tempo & espaço que ainda não havíamos conhecido. Naquele teste, podemos ter a certeza de que nossas vidas não será mais nada do que havíamos imaginado ou planejado. Sim, um susto com alegrias, insegurança e uma grande pergunta: Será que estou pronta? Será que vou dar conta?

E vamos vivendo a partir dessas dúvidas, seguindo exames, consultas, abraços, choros, fome, sono, mudanças de humor, no corpo e muitas expectativas. Até que num exame rotineiro ouvimos algo inesperado, o pior som que qualquer mulher pode ouvir num ultrassom: o silêncio. Novamente nos perdemos num tempo & espaço e uma sensação de queda nos toma por completo. O ar falta, o choro não é mais controlável e até nossos músculos teimam em gritar que estão sentindo. Cada parte de quem fomos e de quem somos se quebra em muitos pedaços e acreditamos que jamais iremos nos reconstruir.

Segundo pesquisas, temos um número de cerca de 23 milhões de mulheres sofrendo um aborto espontâneo a cada ano – o mesmo que dizer que 15% das gestações terminarão num aborto espontâneo (dado referência de 2021). Olhando para esse percentual podemos pensar, por que não falamos sobre isso? Por que eu não conheço mulheres que passaram pela perda de um bebê?

A verdade é que conhecemos muitas mulheres que viveram esse momento, mas infelizmente em nossa cultura nem todos os assuntos da vida são encarados com uma boa aceitação. A morte é um deles e a morte de um bebê é ainda mais impactante e vai sendo deixada num limbo das sensações e acontecimentos de nossas vidas. Muitas mulheres vivem em silêncio sobre suas perdas que sequer são validadas, inclusive por alguns profissionais da assistência.

Não há mais um bebê com vida em nossas vidas e como seguir a partir desse momento?

É preciso apoio. Mulheres precisam de outras mulheres, de rodas, de escuta ativa e acolhedora onde não se julgue toda a onda de sentimentos que surgirá durante o tempo necessário para que ela experencie esse luto. 

É preciso pausar para que possamos apenas respirar e sentir que nossos pulmões se enchem e esvaziem de ar como num balé de resistência. Para que possamos sentir o pulsar de nossos corações e retomar a confiança e a sabedoria de nossos corpos.

É preciso desligar do tempo cronológico e das burocracias para que possamos reverenciar e honrar a vida e a presença daquele bebê que esteve conosco. Assim como é importante o respeito a forma como cada mulher deseja viver esse momento. Devemos considerar a possibilidade de registros, caixa de recordações, escolha de nome e até mesmo um certo distanciamento quando for preciso espaço. É preciso presença atenta.

A vida é forte e segue apesar e além de nós, mas precisamos acreditar. Sentir a terra debaixo de nossos pés e continuar. Descobriremos novos caminhos, ouviremos novas músicas, contaremos nossas histórias que acalmarão nossas dúvidas e incertezas e responderão de forma a acalentar nossa dor. Somos o resultado positivo de milhões de anos de evolução, mas precisamos lembrar que ainda assim não temos o controle sobre a vida.

E alguns dias a saudade virá nos visitar e poderá ser bastante diferente e bom, se durante essas visitas, nós nos permitimos sentir. Reconhecer a saudade, a dor da perda, deixar que ela se aninhe em nosso colo e que seja presente em nós naquele momento. Sem julgamentos ou expectativas. Apenas deixando fluir o que surgir, sem que nos preocupemos em secar lágrimas ou parecer uma fortaleza inabalável. Quando menos esperamos a dor se vai e podemos voltar a colocar nossos pés na grama úmida para sentir a vida ressurgindo intensa bem na nossa frente.

Acolher de forma compassiva todos os sentimentos que podemos viver pode fazer uma grande diferença na forma como nos colocamos no mundo e respondemos as adversidades e desafios que surgirão ao longo de nossas vidas. Exercitarmos a presença e o reconhecimento desses momentos nos fortalece, é ferramenta de autoconhecimento e crescimento pessoal além de impactar positivamente todas as nossas relações.

Na próxima tarde de chuva, quando o coração acelerar, o nó na garganta apertar e você sentir o choro chegando de saudade, experimente apenas não resistir ou controlar. Sinta, respire, reconheça, escreva da sua dor e somente quando estiver pronta, então siga.

Com amor para Gaia, Indra, Liam e Jade

As fotos são de autoria de Patrícia Hernandez 💙

* Patrícia Hernandez é mulher, feminista, ativista pelos direitos sexuais e reprodutivos femininos e pela equidade. Mãe de 3, gestante por 7 vezes. Uma eterna e curiosa aprendiz da vida. Bióloga geneticista, pós-graduada em gestão escolar e pesquisa, artesã, consultora organizacional, produtora de eventos da humanização (Siaparto), co-fundadora. Além de tudo isso, é Certificada GentleBirth.

Afinal, o que faz uma DOULA?

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GentleBirth: Vivendo uma Experiência de Parto Positivo

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